“Você, que é estudante, venha participar do Radioteatro da Mocidade!”,
anunciou o locutor da Rádio MEC. Aos quinze anos, Arlette Pinheiro
cursava secretariado na Berlitz, e decidiu atender ao chamado. Saiu do
subúrbio onde morava com a família e apresentou-se para a seleção no
pequeno prédio da emissora, em frente ao Campo de Santana, no centro do
Rio. Pouco depois de ingressar na rádio, ela adotaria o nome artístico
que viria a se tornar sinônimo de excelência no teatro, no cinema e na
televisão: Fernanda Montenegro.
Essa e muitas outras histórias da atriz estão reunidas, agora, em seu
livro de memórias. Conhecemos a saga de seus antepassados lavradores
portugueses, do lado paterno, e pastores sardos, do lado materno. Lidos
hoje, são relatos que podem “parecer um folhetim. Ou uma tragédia” —
gêneros que Fernanda domina com maestria. Na turma de jovens que
circulavam pela rádio estava Fernando Torres, que ela reencontrou nos
ensaios da peça Alegres canções na montanha
, quando começaram a namorar. Fernando largou a Panair, Fernanda
largou a Berlitz, e o casal se entregou de corpo e alma à arte, paixão
de uma vida. Constituíram uma família e realizaram juntos um sem-número
de peças, ao lado dos principais nomes do teatro brasileiro.
Em páginas de grande emoção, ela narra os desafios de criar os filhos
sobrevivendo como artistas; a busca permanente pela qualidade; a
persistência combativa durante os anos de chumbo; a capacidade de
constante reinvenção; o padecimento de Fernando; o inesperado sucesso
internacional nos anos 1990; a crença na terra que acolheu seus
antepassados imigrantes e a devoção por este país.
Fernanda encarna o melhor do Brasil. Como disse Carlos Drummond de
Andrade: “Não se sabe o que mais admirar nela: se a excelência de atriz
ou a consciência, que ela amadureceu, do papel do ator no mundo. Ela não
se preocupa somente em elevar ao mais alto nível sua arte de
representar, mas insiste igualmente em meditar sobre o sentido, a
função, a dignidade, a expressão social da condição de ator em qualquer
tempo e lugar”.
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