Em
livro de não ficção, autora italiana revela detalhes de seu processo
criativo e traça paralelos entre importantes vozes femininas da
literatura mundial
É
dos antigos cadernos de escola primária que Elena Ferrante resgata suas
primeiras lembranças de escrita. Naquele período, como toda criança,
ela foi ensinada a escrever respeitando o espaço delimitado pelas linhas
pretas horizontais e pelas duas margens vermelhas verticais ─ uma à
esquerda e outra à direita ─ de cada página. Não demorou para o seu
gosto por organização ser desafiado pelo ímpeto de dissolver as margens
que aprisionam a escrita e a própria natureza feminina. Em As margens e o ditado,
que chega às lojas pela Intrínseca, uma das vozes mais instigantes da
literatura contemporânea fala sobre a própria jornada como leitora e
escritora, além de oferecer um raro olhar sobre as origens de seus
caminhos literários. O novo livro de Ferrante será lançado no dia 4 de janeiro, coincidindo com a estreia da série A vida mentirosa dos adultos na Netflix, baseada no romance anterior da autora.
As margens e o ditado reúne três palestras, interpretadas pela
atriz Manuela Mandracchia, por ocasião das Umberto Eco Lectures, e um
ensaio composto para o encerramento da Conferência de Italianistas sobre
Dante, lido pela estudiosa e crítica Tiziana de Rogatis. Nos textos,
não faltam menções a algumas das principais referências literárias de
Ferrante, em especial mulheres, como Virginia Woolf, Emily Dickinson e
Gertrude Stein. Ela também cita livros que a inspiraram na hora de criar
algumas das protagonistas que marcaram sua obra, além de contar como
criou e quais as motivações de suas emblemáticas personagens Lenù e
Lila, deixando pistas do quanto as duas incorporam o próprio dilema da
literatura para a autora.
Além de discorrer sobre suas lutas e sua formação intelectual, Ferrante
descreve os perigos do que ela chama de “língua ruim” e sugere maneiras
pelas quais a tradição há muito excluiu a voz das mulheres. Partindo de
suas brilhantes reflexões a respeito dos trabalhos de autoras notáveis,
ela propõe, então, uma fusão do talento feminino.
Entre os muitos detalhes de seu processo criativo, Ferrante também trata
da questão da narração em primeira pessoa e de seu fascínio pela
observação atenta do mundo que a cerca. Em seu conjunto, as três
palestras (A caneta e a pena, Água-marinha e Histórias, eu) e o ensaio (A costela de Dante)
dão corpo a um livro ao mesmo tempo sutil e potente, com as reflexões e
angústias que atravessam a obra de uma das autoras mais consagradas da
atualidade. As margens e o ditado trata de aventuras na literatura, sejam elas dentro ou fora das margens.
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